4. Procedimento de Ausência

Introdução e Fundamento Legal da Ausência

O instituto da ausência, previsto no Código Civil, é um procedimento jurídico destinado a PROTEGER O PATRIMÔNIO de uma PESSOA que DESAPARECEU de seu domicílio SEM deixar NOTÍCIAS. Esta matéria é tratada de forma detalhada entre os artigos 22 e 39 do Código Civil (CC), que estabelecem desde as hipóteses para sua declaração até as fases de sucessão provisória e definitiva dos bens.


As Duas Hipóteses para a Declaração de Ausência

Para que o procedimento de ausência seja iniciado, o Código Civil prevê duas situações distintas que autorizam sua abertura. É fundamental compreender as particularidades de cada uma.

1ª Hipótese: Desaparecimento SEM Deixar REPRESENTANTE (Art. 22, CC)

Esta é a situação mais comum e intuitiva. Ela ocorre quando uma pessoa desaparece de seu domicílio sem que se tenha notícias de seu paradeiro e, crucialmente, não deixou um representante ou procurador com poderes para administrar seus bens.

<br>

É a situação popularmente exemplificada como a do indivíduo que "foi comprar cigarro e nunca mais voltou", ilustrando um desaparecimento abrupto e sem qualquer planejamento para a gestão do seu patrimônio.

<br>

2ª Hipótese: Mandatário Inexistente ou com Poderes Insuficientes (Art. 23, CC)

A segunda hipótese é menos lembrada, mas igualmente válida. A declaração de ausência também pode ocorrer quando o desaparecido até deixou um mandatário, mas ocorre uma das seguintes situações:

  • O mandatário NÃO QUER ou não PODE exercer ou continuar o mandato que lhe foi confiado.
  • Os PODERES que foram outorgados ao mandatário são INSUFICIENTES para administrar adequadamente todos os bens do ausente.

Nesses casos, mesmo havendo uma tentativa de representação, a proteção do patrimônio se torna inviável, justificando a intervenção judicial para nomear um curador.


Procedimento de Ausência: A Primeira Fase - CURADORIA DOS BENS

Uma vez configurada uma das hipóteses legais, o procedimento de ausência pode ser iniciado. É importante notar que a lei NÃO EXIGE um PRAZO mínimo de desaparecimento para que esta primeira fase comece. O pontapé inicial é o REQUERIMENTO feito ao Poder Judiciário por uma das partes legítimas, que, conforme o art. 22 do CC, são QUALQUER INTERESSADO (como o cônjuge ou um herdeiro) ou o MINISTÉRIO PÚBLICO.

<br>

Após a provocação, o juiz dará início à primeira fase, que se desdobra em TRÊS atos essenciais e sequenciais:

  1. DECLARAÇÃO DE AUSÊNCIA: O primeiro passo é a decisão judicial que reconhece formalmente a condição de ausente da pessoa desaparecida. O juiz declara que o indivíduo está, de fato, em LOCAL INCERTO E NÃO SABIDO.
  2. ARRECADAÇÃO DE BENS: Em seguida, o juiz determina o levantamento completo de todo o patrimônio deixado pelo ausente. Essa arrecadação visa identificar e PROTEGER OS BENS, evitando que se deteriorem ou se percam durante o período de ausência.
  3. NOMEAÇÃO DE UM CURADOR: Com os bens devidamente arrecadados, o juiz nomeia um curador. A função principal deste curador, conforme o art. 25 do CC, é ADMINISTRAR O PATRIMÔNIO do ausente, zelando por sua conservação e gestão até que a situação se resolva.

1. Quem Pode Ser Nomeado Curador do Ausente (Art. 25)?

A escolha do curador não é aleatória; a lei estabelece uma ORDEM DE PREFERÊNCIA clara, priorizando as pessoas com vínculos mais próximos ao ausente. De acordo com o Artigo 25 do Código Civil, a nomeação segue a seguinte hierarquia:

  1. O CÔNJUGE: É o primeiro na linha de preferência, sendo considerado o curador legítimo. No entanto, existem duas exceções importantes: ele NÃO será nomeado se estiver SEPARADO JUDICIALMENTE, QUALQUER TEMPO, OU separado DE FATO por MAIS DE DOIS ANOS antes da data da declaração da ausência.

<br>

E o Companheiro em União Estável? Embora o Art. 25 mencione expressamente apenas o "cônjuge", o entendimento jurídico, consolidado pelo Enunciado nº 97 do Conselho da Justiça Federal (CJF), estende essa preferência ao COMPANHEIRO(a) em UNIÃO ESTÁVEL, equiparando sua situação jurídica à do cônjuge para fins de nomeação como curador dos bens do ausente.

<br>

  1. Os PAIS ou os DESCENDENTES: Na falta de um cônjuge apto, a curadoria recai sobre os pais do ausente. Se estes também não puderem assumir, a responsabilidade passa aos descendentes, respeitando-se sempre a regra de que os MAIS PRÓXIMOS (filhos) PRECEDEM os mais REMOTOS (netos). A lei é específica ao citar "pais", não incluindo todos os "ascendentes".
  2. Um TERCEIRO de CONFIANÇA do JUIZ: Se não houver nenhuma das pessoas mencionadas acima, ou se elas não puderem exercer o cargo, o juiz terá a liberdade de escolher um terceiro que considere IDÔNEO e capaz para a função.

<br>


Procedimento de Ausência: A Segunda Fase - SUCESSÃO PROVISÓRIA (Art. 26)

Após a conclusão da primeira fase (declaração de ausência, arrecadação dos bens e nomeação do curador), o processo entra em um período de espera. A transição para a segunda fase, conhecida como Sucessão Provisória, depende do decurso de um PRAZO LEGAL, que varia conforme a hipótese que deu origem ao procedimento.

<br>

O fundamento para esta fase está no Artigo 26 do Código Civil. Os prazos, contados A PARTIR DA DATA DE ARRECADAÇÃO dos bens, são os seguintes:

  • Prazo de 01 ANO: Aplica-se quando o ausente NÃO deixou REPRESENTANTE ou procurador (hipótese do art. 22 do CC).
  • Prazo de 03 ANOS: Aplica-se quando o ausente havia deixado um MANDATÁRIO que NÃO PODE ou não QUIS continuar com o encargo, ou cujos poderes eram INSUFICIENTES (hipótese do art. 23 do CC).

<br>

Parte da doutrina jurídica debate se os prazos do art. 26 do CC foram tacitamente revogados pelo art. 745, §1º do Código de Processo Civil de 2015, que estabelece um PRAZO ÚNICO de 1 ANO após a PUBLICAÇÃO de EDITAIS. Embora exista essa discussão, a literalidade do Código Civil ainda é amplamente cobrada.

<br>

Decorrido o prazo aplicável, a sucessão provisória NÃO É AUTOMÁTICA. É necessário que um dos INTERESSADOS, listados no art. 27 do CC (como o CÔNJUGE, os HERDEIROS ou CREDORES), requeira formalmente ao juiz a sua abertura.

<br>

Os principais EFEITOS desta fase são:

  1. PARTILHA PROVISÓRIA dos BENS: O patrimônio do ausente é dividido entre os seus herdeiros.
  2. IMISSÃO NA POSSE: Os herdeiros são imitidos na posse dos bens, mas ainda não adquirem a propriedade plena sobre eles. Isso significa que eles podem usar e administrar os bens, mas com certas restrições, pois a sucessão ainda não é definitiva.

Tabela de Revisão Rápida (Síntese Estruturada)

Tópico Central Pontos-Chave (Bulleted list) Conceitos e Definições Dados e Citações Relevantes
Introdução e Fundamento Legal da Ausência - Procedimento para proteger patrimônio de pessoa desaparecida.<br>- Base legal está no Código Civil. Ausência: Instituto jurídico que estabelece a gestão e sucessão dos bens de quem desaparece de seu domicílio sem deixar notícias. Fundamento: Arts. 22 a 39 do Código Civil (CC).
As Duas Hipóteses para a Declaração de Ausência - Abertura pode ocorrer em duas situações distintas.<br>- 1ª: Desaparecimento sem deixar procurador.<br>- 2ª: Mandatário nomeado não pode/quer agir ou tem poderes insuficientes. Hipótese do Art. 22: Desaparecimento simples, sem deixar representante para administrar os bens.<br>Hipótese do Art. 23: Existência de um mandatário que se torna ineficaz. Art. 22: "Desaparecendo uma pessoa do seu domicílio sem dela haver notícia, se não houver deixado representante..."<br>Art. 23: "Quando o ausente deixar mandatário que não queira ou não possa exercer ou continuar o mandato..."
Procedimento de Ausência: A Primeira Fase - Inicia-se por requerimento de interessado ou do MP.<br>- Não exige prazo mínimo de desaparecimento.<br>- Envolve 3 atos: declaração, arrecadação e nomeação de curador. Curadoria dos Bens: Primeira etapa do procedimento, focada na proteção imediata do patrimônio.<br>Arrecadação: Levantamento judicial de todos os bens do ausente. Legitimidade: "requerimento de qualquer interessado ou do Ministério Público."
Quem Pode Ser Nomeado Curador do Ausente? - A lei define uma ordem de preferência para a nomeação.<br>- Cônjuge tem prioridade, com exceções.<br>- Companheiro de união estável é equiparado ao cônjuge. Ordem Legal (Art. 25): 1º Cônjuge; 2º Pais, depois Descendentes; 3º Terceiro escolhido pelo juiz.<br>Exceções do Cônjuge: Não pode ser curador se separado judicialmente ou de fato há mais de 2 anos. Enunciado nº 97, CJF: Estende as regras do cônjuge ao companheiro.
Procedimento de Ausência: A Segunda Fase - Inicia-se após o decurso de 1 ou 3 anos da arrecadação.<br>- É chamada de Sucessão Provisória.<br>- Herdeiros são imitidos na posse, não na propriedade. Sucessão Provisória: Fase em que os herdeiros recebem a posse dos bens para administrá-los, mediante requerimento judicial após o prazo legal. Prazos (Art. 26): 01 ano (se não havia procurador) ou 03 anos (se havia procurador) após a arrecadação dos bens.
Avatar de diego
há 2 semanas
Matéria: Direito Civil
Artigo
73

0 Comentários

Nenhum comentário. Seja o primeiro a comentar!

Você precisa entrar para comentar.