Introdução: O Potencial das Teses Tributárias para Pessoas Físicas
O universo do Direito Tributário é vasto e dinâmico, frequentemente associado a grandes disputas empresariais envolvendo regimes como o Lucro Real. No entanto, essa percepção limitada pode fazer com que muitos advogados deixem de explorar um nicho extremamente rentável e com alta demanda: as teses tributárias voltadas para pessoas físicas.
Existem diversas oportunidades tributárias significativas que afetam diretamente o cidadão comum, mas que, por falta de conhecimento técnico ou de prospecção, acabam sendo ignoradas. Advogados que não dominam essas oportunidades podem estar, literalmente, "deixando dinheiro na mesa", tanto em termos de honorários quanto na possibilidade de oferecer soluções valiosas para seus clientes.
A advocacia tributária para pessoas físicas abrange desde questões do Simples Nacional e Lucro Presumido até situações específicas de contribuintes individuais. Entre as diversas possibilidades, uma das teses mais relevantes, escaláveis e de grande impacto social é a que trata da isenção do Imposto de Renda para aposentados portadores de doenças graves. Esta tese se destaca por duas razões principais:
- Alto Volume de Beneficiários: A quantidade de pessoas que se enquadram nos requisitos (ser aposentado e possuir uma das doenças listadas em lei) é muito elevada.
- Jurisprudência Favorável: As decisões judiciais sobre o tema são, em sua maioria, muito favoráveis aos contribuintes, conferindo segurança para a atuação profissional.
Explorar essa área não apenas gera rentabilidade — permitindo a restituição de valores pagos indevidamente nos últimos cinco anos —, mas também cumpre uma função social importante, auxiliando pessoas em momentos de vulnerabilidade.
O Fundamento Legal: A Isenção de IRPF na Lei 7.713/88
O ponto de partida para compreender esta tese tributária é a Lei nº 7.713, de 22 de dezembro de 1988. Especificamente, o artigo 6º desta lei estabelece as hipóteses de isenção do Imposto de Renda para pessoas físicas.
O dispositivo legal é claro ao determinar quais rendimentos são isentos. Conforme o texto da lei:
Art. 6º Ficam isentos do imposto de renda os seguintes rendimentos percebidos por pessoas físicas:
XIV – os proventos de aposentadoria ou reforma motivada por acidente em serviço e os percebidos pelos portadores de moléstia profissional, tuberculose ativa, alienação mental, esclerose múltipla, neoplasia maligna, cegueira, hanseníase, paralisia irreversível e incapacitante, cardiopatia grave, doença de Parkinson, espondiloartrose anquilosante, nefropatia grave, hepatopatia grave, estados avançados da doença de Paget (osteíte deformante), contaminação por radiação, síndrome da imunodeficiência adquirida, com base em conclusão da medicina especializada, mesmo que a doença tenha sido contraída depois da aposentadoria ou reforma.
A legislação, portanto, desobriga o contribuinte que recebe proventos de aposentadoria (ou reforma) e que é acometido por uma dessas doenças graves de pagar o Imposto de Renda sobre esse benefício.
É crucial notar que a lei lista especificamente as condições que dão direito à isenção. Na prática diária da advocacia tributária, algumas dessas doenças aparecem com mais frequência, como a neoplasia maligna (câncer), a cardiopatia grave e a cegueira (inclusive a cegueira monocular, conforme entendimento jurisprudencial consolidado).
Qualquer pessoa que esteja aposentada e possua um diagnóstico de uma dessas condições, portanto, não deveria estar sofrendo a retenção do IRPF sobre sua aposentadoria.
Limites da Isenção: O Rol Taxativo de Doenças (Tema 250 STJ) e a Inaplicabilidade para Trabalhadores da Ativa
Embora a tese da isenção seja robusta, é fundamental conhecer seus limites para orientar corretamente os clientes e evitar ações judiciais sem fundamento. A jurisprudência, baseada no artigo 111 do Código Tributário Nacional (CTN) — que exige a interpretação literal da legislação sobre isenções —, estabeleceu duas restrições principais.
1. O Rol de Doenças é Taxativo (Exaustivo)
Uma das primeiras grandes discussões judiciais sobre o tema foi se a lista de doenças do artigo 6º, XIV, da Lei 7.713/88 seria meramente exemplificativa, permitindo a inclusão de outras doenças graves não listadas.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) pacificou essa questão no Tema 250, definindo que a lista é taxativa (ou exaustiva). Isso significa que apenas as doenças expressamente enumeradas na lei dão direito ao benefício.
Tema 250 (STJ): "O rol contido no art. 6º, XIV, da Lei 7.713/88 é taxativo (numerus clausus), vale dizer, restringe a concessão de isenção do imposto de renda às situações nele enumeradas."
Portanto, um contribuinte com uma doença grave que não esteja na lista (ou que não possa ser enquadrada em uma das categorias mais amplas, como "alienação mental", que pode abranger condições como o Alzheimer) não terá direito à isenção.
2. A Isenção Não se Aplica a Trabalhadores da Ativa
Outra tentativa de ampliação da tese foi estender o benefício a trabalhadores que ainda estão na ativa (recebendo salário) mas que foram acometidos por uma das doenças graves listadas.
O argumento era que o objetivo da lei era aliviar os encargos financeiros do tratamento, independentemente de o contribuinte estar aposentado ou não. Contudo, o STJ e o Supremo Tribunal Federal (STF) rejeitaram essa tese.
A lei é explícita ao garantir a isenção apenas sobre "proventos de aposentadoria ou reforma". O STF, no Tema 1.037, firmou a seguinte tese de repercussão geral:
Tema 1.037 (STF): "Não se aplica a isenção do imposto de renda prevista no inciso XIV do artigo 6º da Lei nº 7.713/1988 (seja na redação da Lei nº 11.052/2004 ou na redação original) aos rendimentos de portador de moléstia grave que se encontre no exercício de atividade laboral."
Dessa forma, a isenção é restrita aos aposentados e reformados. Um trabalhador da ativa que adquire a doença não pode pedir a isenção sobre seu salário, mas poderá, eventualmente, buscar uma aposentadoria por invalidez (benefício por incapacidade permanente) para, então, usufruir do benefício tributário.
Ponto Chave 1: A Desnecessidade de Laudo Médico Oficial (Súmula 598 STJ)
Uma das maiores barreiras enfrentadas pelos contribuintes ao buscar essa isenção, seja na via administrativa ou judicial, era a exigência de um laudo médico emitido por um serviço oficial (como o INSS ou um órgão público de saúde). Muitas vezes, a obtenção desse laudo é demorada ou o pedido é negado, mesmo diante de provas médicas robustas.
Para resolver essa questão processual, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) editou a Súmula 598, que flexibilizou a comprovação da doença em juízo:
Súmula 598 (STJ): "É desnecessária a apresentação de laudo médico oficial para o reconhecimento judicial da isenção do imposto de renda, desde que o magistrado entenda suficientemente demonstrada a doença grave por outros meios de prova."
Essa súmula é de extrema importância para a advocacia tributária, pois traz dois benefícios processuais relevantes:
- Celeridade Processual: Ao dispensar a perícia judicial ou o laudo oficial quando já existem provas suficientes (como laudos de médicos particulares, exames e relatórios de tratamento), o processo pode tramitar muito mais rapidamente. Evita-se a longa fila de perícias, que muitas vezes é a mesma utilizada para os benefícios do INSS.
- Viabilidade da Tutela de Urgência: A súmula fortalece o pedido de antecipação de tutela (liminar). O advogado pode demonstrar ao juiz que, com base nos documentos médicos anexados à petição inicial e no entendimento da Súmula 598, a probabilidade do direito é alta, permitindo que o juiz determine a suspensão imediata dos descontos do IRPF na fonte, antes mesmo da sentença final.
Ponto Chave 2: O Direito se Mantém Mesmo Após a Cura da Doença (Súmula 627 STJ)
Uma dúvida muito comum entre os contribuintes, e até mesmo um motivo frequente para a negação de pedidos na via administrativa, é a seguinte: se o paciente foi curado ou se a doença está em remissão (sem sintomas), ele perde o direito à isenção?
Muitos aposentados que tiveram, por exemplo, neoplasia maligna (câncer) e receberam alta médica, acreditam que não podem mais solicitar o benefício. No entanto, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) consolidou o entendimento de que a isenção deve ser mantida, independentemente da cura.
A Súmula 627 do STJ é categórica a esse respeito:
Súmula 627 (STJ): "O contribuinte faz jus à concessão ou à manutenção da isenção do imposto de renda, não se lhe exigindo a demonstração da contemporaneidade dos sintomas da doença nem da recidiva da enfermidade."
Este entendimento é fundamental. Ele significa que, uma vez que o aposentado foi diagnosticado com uma das doenças listadas, o direito à isenção é adquirido e não cessa, mesmo que laudos médicos futuros atestem que o paciente está curado ou que a doença não apresenta mais sintomas.
Para o cliente, isso é uma notícia excelente. Um aposentado que teve câncer há cinco anos, está curado e não sabia desse direito, pode não só pedir a isenção para parar de pagar o IRPF daqui para frente, mas também restituir tudo o que pagou nos últimos cinco anos, contados da data em que a ação for ajuizada.
O Início do Benefício: A Validade a Partir da Data do Diagnóstico
Outro ponto fundamental, especialmente para o cálculo dos valores a restituir, é definir o termo inicial do direito à isenção. Muitos contribuintes descobrem a doença em um ano, mas só buscam o reconhecimento do seu direito (administrativa ou judicialmente) anos depois.
A Receita Federal, muitas vezes, só concede a isenção a partir da data do laudo oficial ou da data do requerimento administrativo. Contudo, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) é mais benéfica ao contribuinte, entendendo que o direito nasce no momento em que a doença é comprovada.
Conforme entendimento do STJ, o termo inicial para a isenção do Imposto de Renda é a data do diagnóstico médico que comprovou a doença grave, e não a data de emissão do laudo oficial ou a data do pedido.
Isso significa que, se um aposentado foi diagnosticado com uma das doenças em 2018, mas só entrou com o pedido de isenção em 2022, ele terá o direito de restituir os valores pagos indevidamente desde 2018 (respeitando o limite prescricional de cinco anos).
Esse entendimento protege o contribuinte que, muitas vezes por desconhecimento da lei, continuou pagando o imposto mesmo após já ter o direito à isenção.
Ampliando o Alcance: A Isenção sobre Previdência Complementar (PGBL/VGBL) e Resgates
Um dos aspectos mais rentáveis desta tese, e que muitos advogados desconhecem, é que a isenção do Imposto de Renda não se aplica apenas aos benefícios pagos pelo INSS (Regime Geral de Previdência Social) ou por Regimes Próprios (servidores públicos). Ela se estende integralmente aos valores recebidos a título de previdência complementar privada.
O próprio regulamento do Imposto de Renda (Decreto nº 9.580/2018) prevê, em seu artigo 35, § 4º, que a isenção se aplica à "complementação de aposentadoria, reforma ou pensão".
Isso significa que aposentados que recebem valores de fundos de pensão (sejam eles PGBL ou VGBL) e que possuem uma das doenças graves listadas, também têm o direito de não pagar IRPF sobre esses rendimentos.
Onde essa tese se torna financeiramente muito expressiva é nos casos de resgate dos valores. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) já pacificou o entendimento de que a isenção se aplica tanto aos recebimentos mensais quanto ao resgate único (saque total) da reserva matemática acumulada no plano de previdência privada.
Conforme a jurisprudência do STJ, "não deve haver incidência do imposto de renda sobre a complementação decorrente da aposentadoria privada ou sobre o resgate da reserva matemática da aposentadoria privada", valendo tanto para PGBL quanto para VGBL, quando o contribuinte padece de uma das moléstias listadas.
Nesses casos, os valores a restituir podem ser muito elevados. Imagine um cliente que, ao se aposentar, resgatou R$ 1 milhão de um plano de previdência privada e sofreu uma retenção de imposto de renda na fonte. Se ele possuía o diagnóstico de uma das doenças graves, esse valor retido foi indevido e pode ser totalmente recuperado.
Como Requerer Judicialmente: A Ação de Repetição de Indébito
Embora o pedido de isenção possa ser feito administrativamente (o que pode ou não ser vantajoso, a depender do caso), a via judicial é frequentemente a mais eficaz para garantir tanto a cessação do pagamento quanto a restituição dos valores passados. Não é necessário esgotar a via administrativa para ingressar com a ação judicial.
A ação adequada para esse fim é a Ação Ordinária de Declaração de Inexistência de Relação Jurídica c/c Repetição de Indébito, movida contra a União Federal (representada pela Procuradoria da Fazenda Nacional).
O nome da ação reflete os três pedidos principais que ela contém:
- Pedido de Tutela de Urgência (Liminar): Este é o pedido mais imediato. Com base nas provas documentais (laudos, exames) e nas Súmulas dos tribunais superiores, o advogado solicita que o juiz determine imediatamente à União que cesse os descontos do Imposto de Renda na fonte (seja do INSS ou da entidade de previdência privada).
- Declaração de Inexistência de Relação Jurídica: Este é o pedido principal para o futuro. O objetivo é que o juiz declare, por sentença, que o contribuinte não tem a obrigação legal (relação jurídica) de pagar o IRPF sobre seus proventos de aposentadoria, confirmando a isenção.
- Repetição de Indébito: Este é o pedido referente ao passado. O advogado solicita a condenação da União a restituir todos os valores que foram indevidamente pagos ou retidos nos últimos cinco anos, contados da data do ajuizamento da ação. Esses valores devem ser devolvidos acrescidos da taxa SELIC.
Para ajuizar a ação, é crucial anexar todos os documentos que comprovem a condição de aposentado (como o Kinis ou carta de concessão) e os laudos e exames médicos que atestem o diagnóstico da doença grave, fundamentando o pedido de dispensa de perícia com base na Súmula 598 do STJ.
Conclusão: O Impacto da Tese na Vida do Contribuinte
A tese da isenção do Imposto de Renda para aposentados com doenças graves vai muito além de uma simples discussão técnica-tributária. Ela representa uma oportunidade real de levar justiça fiscal e alívio financeiro a pessoas que, em muitos casos, já enfrentam uma situação de grande vulnerabilidade física, emocional e financeira.
Para o contribuinte, o reconhecimento desse direito significa um aumento imediato em sua renda mensal líquida, já que os descontos do IRPF cessam. Além disso, a restituição dos últimos cinco anos representa um resgate de valores significativos, que podem auxiliar na cobertura de custos com tratamentos, medicamentos ou simplesmente melhorar sua qualidade de vida.
Para o advogado, dominar essa tese abre um campo de atuação escalável e rentável. Casos de sucesso, como os que envolvem a restituição de centenas de milhares de reais em regimes de previdência complementar ou regimes próprios, demonstram o potencial financeiro da matéria. É uma área onde o profissional pode, simultaneamente, obter excelentes honorários de êxito e causar um impacto social positivo e direto na vida de seus clientes.
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ FEDERAL DA ____ VARA FEDERAL DA SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE [CIDADE/ESTADO]
[NOME COMPLETO DO AUTOR], [nacionalidade], [estado civil], aposentado(a), portador(a) da cédula de identidade RG nº [...], inscrito(a) no CPF/MF sob o nº [...], residente e domiciliado(a) na [Endereço completo com CEP], e-mail: [e-mail do autor], vem, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, por seu(sua) advogado(a) infra-assinado(a) (procuração anexa - Doc. 01), com endereço profissional na [Endereço do Advogado], e-mail: [e-mail do advogado], onde recebe intimações, propor a presente
AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA (LIMINAR)
em face da UNIÃO (FAZENDA NACIONAL), pessoa jurídica de direito público interno, inscrita no CNPJ sob o nº [...], representada pela Procuradoria da Fazenda Nacional, com endereço na [Endereço da Procuradoria Regional/Seccional], pelos fatos e fundamentos jurídicos a seguir expostos:
I. DA PRIORIDADE NA TRAMITAÇÃO (DOENÇA GRAVE / IDOSO)
Conforme documentação anexa (Doc. 02 - Laudos Médicos), a parte Autora é portadora de [Nome da Doença Grave], enquadrando-se na hipótese de doença grave prevista em lei.
(Se aplicável) Adicionalmente, a parte Autora conta atualmente com [Idade] anos, sendo considerada pessoa idosa nos termos da lei (Doc. 03 - Documento de Identidade).
Dessa forma, requer, com fundamento no art. 1.048, inciso I, do Código de Processo Civil, e no art. 71 do Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741/03), a concessão do benefício de prioridade na tramitação do presente feito.
II. DOS FATOS
A parte Autora é beneficiária de aposentadoria [Modalidade da Aposentadoria, ex: por tempo de contribuição] junto ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), sob o Benefício nº [Número do Benefício] (Doc. 04 - Carta de Concessão/CNIS).
Conforme se observa nos comprovantes de rendimentos anexos (Doc. 05), a parte Autora sofre mensalmente a retenção de Imposto de Renda (IRPF) sobre seus proventos de aposentadoria, no valor médio de R$ [...] (reais).
Ocorre que, em [Data do Diagnóstico, ex: 10/05/2019], a parte Autora foi diagnosticada com [Nome da Doença Grave, ex: Neoplasia Maligna de Próstata], classificada sob o CID [Código CID], conforme robusta documentação médica anexa (Doc. 02 - Laudos, Exames, Relatórios).
Referida doença está expressamente listada no rol do art. 6º, inciso XIV, da Lei nº 7.713/88, o que garante à parte Autora o direito à isenção total do Imposto de Renda sobre seus proventos de aposentadoria.
(Se aplicável, para reforçar Súmula 627) Atualmente, a parte Autora encontra-se em fase de [remissão/tratamento contínuo/curada], contudo, conforme entendimento sumulado, a ausência de sintomas contemporâneos não afasta o direito à isenção.
Apesar do claro direito, a parte Autora continua sofrendo os descontos indevidos, razão pela qual busca a tutela jurisdicional para ver seu direito reconhecido, cessar os descontos e reaver os valores pagos indevidamente nos últimos 5 (cinco) anos.
III. DO DIREITO
3.1. Da Isenção do Imposto de Renda (Lei nº 7.713/88)
O direito da parte Autora está amparado no art. 6º, XIV, da Lei nº 7.713/88, que é taxativo ao isentar os proventos de aposentadoria dos portadores das doenças graves ali listadas:
Art. 6º Ficam isentos do imposto de renda os seguintes rendimentos percebidos por pessoas físicas: XIV – os proventos de aposentadoria ou reforma motivada por acidente em serviço e os percebidos pelos portadores de [...], [Nome da Doença Grave], [...], com base em conclusão da medicina especializada, mesmo que a doença tenha sido contraída depois da aposentadoria ou reforma;
Como demonstrado pelos fatos e documentos, a parte Autora preenche todos os requisitos legais: (i) é aposentada e (ii) é portadora de uma das doenças graves listadas.
3.2. Da Desnecessidade de Laudo Oficial (Súmula 598/STJ)
Para fins de comprovação judicial, é pacífico o entendimento de que o magistrado não está adstrito ao laudo médico oficial, podendo formar sua convicção com base em outras provas. A Súmula 598 do Superior Tribunal de Justiça é clara:
Súmula 598, STJ: "É desnecessária a apresentação de laudo médico oficial para o reconhecimento judicial da isenção do imposto de renda, desde que o magistrado entenda suficientemente demonstrada a doença grave por outros meios de prova."
Os laudos médicos e exames particulares anexos (Doc. 02) são mais que suficientes para atestar a moléstia, dispensando-se a realização de perícia judicial e viabilizando, inclusive, a concessão da tutela de urgência.
3.3. Da Irrelevância da Cura ou Ausência de Sintomas (Súmula 627/STJ)
É fundamental destacar que, mesmo em casos de cura ou remissão da doença, o direito à isenção permanece. A finalidade da norma é minorar o sacrifício financeiro do aposentado que já sofreu (e muitas vezes continua sofrendo, com exames de acompanhamento) com a doença.
Neste sentido, dispõe a Súmula 627 do Superior Tribunal de Justiça:
Súmula 627, STJ: "O contribuinte faz jus à concessão ou à manutenção da isenção do imposto de renda, não se lhe exigindo a demonstração da contemporaneidade dos sintomas da doença nem da recidiva da enfermidade."
3.4. Da Repetição do Indébito
Uma vez reconhecida a isenção, o termo inicial do direito retroage à data do diagnóstico da doença, conforme jurisprudência pacífica do STJ.
Tendo em vista que o diagnóstico ocorreu em [Data do Diagnóstico], todos os valores descontados a título de IRPF desde aquela data (respeitada a prescrição quinquenal) constituem pagamento indevido (indébito tributário), devendo ser restituídos, conforme art. 165, I, do Código Tributário Nacional.
IV. DA TUTELA DE URGÊNCIA (ANTECIPAÇÃO DA TUTELA)
Nos termos do art. 300 do CPC, a tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano. Ambos os requisitos estão preenchidos:
- A Probabilidade do Direito (Fumus Boni Iuris): É cristalina. A documentação (laudos e carta de concessão) comprova inequivocamente que o(a) Autor(a) preenche os requisitos do art. 6º, XIV, da Lei 7.713/88. As Súmulas 598 e 627 do STJ reforçam a robustez do direito.
- O Perigo de Dano (Periculum in Mora): É evidente. A parte Autora é pessoa [idosa/doente], e os proventos de aposentadoria possuem natureza alimentar. A manutenção do desconto indevido de IRPF reduz sua capacidade financeira, prejudicando o próprio sustento e a aquisição de medicamentos e tratamentos necessários.
Diante do exposto, é imperativa a concessão da tutela de urgência para determinar que a Ré (União) se abstenha imediatamente de efetuar os descontos de IRPF sobre os proventos de aposentadoria da parte Autora.
V. DOS PEDIDOS
Ante o exposto, requer a Vossa Excelência:
a) A concessão do benefício da Prioridade na Tramitação, nos termos do art. 1.048, I, do CPC;
b) A concessão da Tutela de Urgência, inaudita altera pars, para determinar que a Ré (União) suspenda imediatamente qualquer desconto a título de Imposto de Renda (IRPF) sobre os proventos de aposentadoria da parte Autora (Benefício nº [...]), sob pena de multa diária;
c) A citação da União (Fazenda Nacional), na pessoa de seu representante legal, para, querendo, apresentar contestação no prazo legal;
d) (Se aplicável) A concessão dos benefícios da Justiça Gratuita, por ser a parte Autora pobre na acepção jurídica do termo, não podendo arcar com as custas processuais sem prejuízo do próprio sustento (Declaração anexa - Doc. 06);
e) Ao final, a total PROCEDÊNCIA da ação para: e.1) Declarar a inexistência de relação jurídico-tributária que obrigue a parte Autora ao pagamento do Imposto de Renda sobre seus proventos de aposentadoria, confirmando a tutela de urgência; e.2) Condenar a União a restituir (repetição de indébito) todos os valores indevidamente descontados a título de IRPF, a contar da data do diagnóstico em [Data do Diagnóstico], respeitada a prescrição quinquenal, devendo os valores ser corrigidos monetariamente pela taxa SELIC, desde cada pagamento indevido;
f) A condenação da Ré ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios de sucumbência, em percentual a ser fixado por Vossa Excelência;
g) Protesta provar o alegado por todos os meios de prova em direito admitidos, em especial a prova documental já acostada.
Dá-se à causa o valor de R$ [Valor correspondente à soma dos valores a restituir + 12 parcelas futuras].
Termos em que, Pede deferimento.
[Local], [Data].
[NOME DO(A) ADVOGADO(A)] OAB/[UF] nº [Número da OAB]
ATENÇÃO: Este é um modelo educacional e exemplificativo. A contratação de um(a) advogado(a) qualificado(a) é indispensável para analisar o caso concreto, adaptar a peça e conduzir o processo judicial. Não utilize este modelo sem a supervisão de um profissional.
Cronograma Passo a Passo para a Ação Judicial de Isenção de IRPF
Este guia detalha as etapas que o contribuinte e seu advogado devem seguir para garantir o direito à isenção do Imposto de Renda sobre a aposentadoria por doença grave e a restituição dos valores pagos indevidamente.
Fase 1: Preparação e Coleta de Documentos (Cliente)
O sucesso da ação depende de uma documentação robusta que comprove os dois requisitos básicos da lei: 1) Ser aposentado; 2) Ser portador da doença.
Passo 1: Comprovação da Aposentadoria
- O que fazer: Reunir provas de que recebe aposentadoria, reforma ou pensão.
- Documentos Necessários:
- Carta de Concessão do benefício (INSS ou do órgão público, no caso de servidor).
- Extrato do CNIS (Cadastro Nacional de Informações Sociais) – Obtido no portal "Meu INSS".
- Comprovantes de Rendimentos/Contracheques recentes da aposentadoria (onde consta o desconto do IRPF).
- Declarações de Imposto de Renda (DIRPF) dos últimos 5 anos (para comprovar os pagamentos e auxiliar no cálculo dos valores a restituir).
Passo 2: Comprovação da Doença Grave
- O que fazer: Reunir todo o histórico médico que ateste o diagnóstico da doença grave listada na Lei 7.713/88.
- Documentos Necessários:
- Laudos Médicos: O documento mais importante. Deve ser claro, conter o nome da doença e o respectivo CID (Código Internacional da Doença). Idealmente, conseguir um laudo recente atestando a situação, mesmo que seja de cura ou remissão (para usar a Súmula 627 STJ).
- Data do Diagnóstico: Essencial que algum documento (laudo ou exame antigo) mostre quando a doença foi descoberta. Isso definirá o início do direito à restituição.
- Exames Complementares: Biópsias, exames de imagem (ressonância, tomografia), exames laboratoriais, etc.
- Relatórios Médicos: Descrições de tratamentos realizados (cirurgias, quimioterapia, radioterapia).
- Receituário: Comprovantes de uso de medicação contínua (se houver).
- (Opcional) Laudo de médico oficial (SUS, perito do INSS), se houver. Se não houver, não é impeditivo (Súmula 598 STJ).
Passo 3: Documentos Pessoais
- RG e CPF (ou CNH).
- Comprovante de residência atualizado.
Fase 2: Ajuizamento da Ação (Advogado)
Com os documentos em mãos, o advogado inicia o processo judicial.
Passo 4: Análise e Cálculo Prévio
- O que fazer: O advogado analisa os documentos para confirmar o direito.
- Ação:
- Verificar se a doença se enquadra no rol taxativo da lei.
- Identificar a data exata do diagnóstico (para o cálculo da restituição).
- Calcular uma estimativa dos valores a serem restituídos (com base nos comprovantes de rendimento e declarações de IR dos últimos 5 anos).
- Preparar a procuração e o contrato de honorários.
Passo 5: Elaboração da Petição Inicial
- O que fazer: Redigir a "Ação Ordinária de Declaração de Inexistência de Relação Jurídica c/c Repetição de Indébito".
- Ação:
- Endereçar a ação à Justiça Federal (pois o réu é a União Federal).
- Narrar os fatos (condição de aposentado, diagnóstico da doença).
- Fundamentar o direito (Lei 7.713/88, Súmulas 598 e 627 do STJ, Tema 1.037 STF, etc.).
- Formular os pedidos (Tutela de Urgência, Declaração de Inexistência da Dívida e Restituição).
- (Importante) Pedir Justiça Gratuita (se aplicável) ou anexar o comprovante de custas judiciais.
- Pedir prioridade de tramitação (se o cliente for idoso ou portador de doença grave).
Passo 6: Protocolo da Ação
- O que fazer: Iniciar o processo no sistema eletrônico da Justiça Federal (PJe).
- Ação:
- Distribuir a ação e anexar todos os documentos coletados nos Passos 1, 2 e 3.
Fase 3: Andamento Processual (Advogado e Justiça)
Passo 7: Análise da Tutela de Urgência (Liminar)
- O que fazer: O juiz analisa o pedido liminar, o que geralmente ocorre rápido (dias ou poucas semanas).
- Resultados Possíveis:
- Deferido: O juiz manda a União (fonte pagadora) parar imediatamente de descontar o IRPF da aposentadoria.
- Indeferido: O juiz entende que precisa de mais provas (citação da União ou perícia) antes de decidir.
Passo 8: Citação e Defesa da União
- O que fazer: A União Federal (PGFN) é notificada do processo e apresenta sua defesa (contestação).
- Ação: Geralmente, a União alega que a doença não está provada, que o laudo não é oficial, ou que a cura extingue o direito (argumentos já superados pelas Súmulas).
Passo 9: Réplica e Instrução (Perícia, se necessária)
- O que fazer: O advogado responde à defesa da União (Réplica).
- Ação: O juiz decide se as provas documentais são suficientes.
- Se suficientes: O juiz anuncia o "Julgamento Antecipado da Lide".
- Se insuficientes: O juiz pode marcar uma perícia médica judicial (mesmo com a Súmula 598, alguns juízes preferem confirmar a doença).
Passo 10: Sentença
- O que fazer: O juiz profere a decisão final de primeira instância.
- Ação: Se procedente, o juiz confirma a liminar (se houver), declara a isenção definitiva e condena a União a pagar a restituição (os "atrasados").
Fase 4: Recursos e Execução (Fase Final)
Passo 11: Recursos (Se houver)
- O que fazer: Se a União recorrer, o processo sobe para o Tribunal Regional Federal (TRF).
- Ação: O advogado apresenta as contrarrazões ao recurso, reforçando a aplicação das Súmulas. Esta fase pode demorar, mas o direito do cliente é muito provável de ser confirmado.
Passo 12: Trânsito em Julgado e Execução
- O que fazer: Após não haver mais possibilidade de recurso, a decisão é definitiva (Trânsito em Julgado).
- Ação (A mais importante para o cliente):
- O advogado inicia a fase de "Cumprimento de Sentença" (Execução).
- Apresenta a planilha de cálculo detalhada dos últimos 5 anos, com juros (SELIC).
- A União é intimada para pagar. O pagamento é feito via Precatório ou RPV (Requisição de Pequeno Valor), a depender do montante.